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help Mia transition ♡

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PT: Eu sou a Mia e estou a precisar da vossa ajuda para conseguir avançar com a minha transição. Como sabem é um processo muito demorado e caro e por isso decidi criar este GoFundMe para conseguir terminar a minha transição. Toda a ajuda é bem-vinda, seja com doações ou com partilhas. 

Abaixo tem um textinho sobre o meu percurso, sei que é grande mas fazia muito sentido para mim se pudesses ler as minhas palavras. 




 O meu nome é Ana Margarida. Até há bem pouco tempo nem eu própria sabia que era esse o meu nome. Tratava-me por um outro nome, um outro ser, uma outra pessoa que não eu. Soube desde sempre que não me encaixava naquilo que o mundo tinha planeado para mim. O mundo planeia coisas para nós mesmo antes de nos ver, de nos ouvir ou de nos sentir. Bastam umas ecografias para que se decida o que tenho de ser, o que tenho de pensar, o que tenho de vestir, o lugar que devo ocupar na sociedade, o que devo fazer e especialmente o que não devo fazer. Os últimos cinco anos da minha vida foram uma verdadeira montanha russa, anos de muita descoberta, exploração e crescimento. Cresci feliz. Não me faltou nada, nem material nem sentimental. Era uma criança normal, muito ligada às artes do espetáculo em geral. A música sempre esteve presente. Desde os cd´s de gosto questionável da minha mãe, aos grandes concertos que dava na minha cabeça agarrada ao cabo de qualquer vassoura para passar o tempo. Percebi que era diferente em relação à sexualidade e ao género desde… sempre. Em pequena nunca o questionei, porque são assuntos que não estão para serem discutidos. “É o que é”. Quando olhava, num shopping, num filme, na rua, para um casal hetero eu imaginava-me na posição da rapariga, atraída pelo rapaz. E isto soava-me normal. Até ter entrado para a escola. Imagino que começar a escola primária deve ser assustador para qualquer criança mas eu não podia sequer adivinhar o trauma que daí ia surgir. Foi na escola primária que percebi que o que eu sentia não era tão normal assim. Eu não devia estar sempre com as raparigas a brincar com as bonecas e sim com os rapazes a jogar futebol no campo e a lutar pelo motivo mais fútil. Eu não devia passar os intervalos a inventar coreografias para as musicas da Lady Gaga que passavam na radio. E então percebi que havia um lugar para mim. Eu seria então um gay - um rapaz que gosta de outros rapazes. Só não sabia o quanto isso me iria fazer sofrer. Na altura não me apercebi do quão obvio era, nem como é que toda a gente na escola sabia disso, se importava com isso e usava isso contra mim todos os dias a toda a hora. No inicio eram só risinhos, comentários, um “paneleiro” aqui um “maricas” ali. Até que passou à violência física. Levar um estalo só porque sim, levar um pontapé só porque era um paneleiro. Lembro-me vivamente do dia em que só queria ir à casa de banho durante uma aula como qualquer outra criança e tinha um dos alunos da escola, mais velho do que eu pronto para me esganar contra a parede enquanto que dava joelhadas nos genitais. Tenho desde então esta imagem de estar a ser agredida repetidamente sem ninguém à volta para o parar. Isso marcou o dia em que passou a ser impensável ir à casa de banho durante o dia de aulas. Ia de manhã, ao acordar e depois ao fim do dia quando chegasse a casa. Faria-o para me proteger. Esta foi a minha realidade durante quatro anos. Entre os meus seis e os dez anos. Acho que nem preciso de dizer o quão mau é achar-se que o pior da tua vida será aos 10 anos. Não foi. Mudei de escola e tudo piorou. Pensei que ia finalmente ter um novo começo, do zero, desta vez ligeiramente mais crescida e consciente. Ia ser com certeza melhor. Não foi. Começou logo no primeiro dia de aulas. No intervalo do almoço, estava a conhecer a escola ainda, quando fiquei sozinha por segundos. Que foram suficientes para que do nada uns 6 rapazes mais velhos me cercassem e começassem a chamar nomes e a cuspir-me na cara. Tive a sorte de uma rapariga estar perto. Ela começou a gritar com eles e deu-me espaço para fugir. Não estava segura em lado nenhum. E passei esse dia a correr de lado para lado, para que ninguém me pudesse apanhar. No final do dia, tive de ir com a minha mãe comprar uma nova mochila. Aquela já estava com as alças descosidas de tanto que corri com ela. As minhas costas e ombros ficaram também pisados e foi esse um dos primeiros contactos que a minha mãe teve com a situação que se andava a passar. Eu estava a ser vitima de bullying. Não houve um dia que eu saísse daquela escola sem ter sido vitima de agressões. Fossem elas verbais, físicas ou materiais. Aquele passou a ser o meu novo normal. Passei a odiar-me. O problema só podia estar em mim. E algo em mim não batia certo, mesmo que eu não conseguisse propriamente definir o que. Deixei de comer… foi por isso que do nada emagreci imenso. Deixei de comer em parte, por opção, para não ser mais “o gordo”. E por outra parte, porque muitas vezes na cantina os outros miúdos cuspiam no meu prato, atiravam-me lixo para a comida e via as funcionárias a verem aquilo sem fazer nada. Eu não tinha voz. Havia dias que ameaçavam com isqueiros e x-atos. Deveria ter uns 11 ou 12 anos, e isso marca. Essa foi a fase mais escura da minha vida, tão escura que eu não sei como é que sobrevivi. Tentei desistir. Tentei acabar com tudo. Estive muito perto de estar muito longe. Eu, uma criança, estava a tentar o suicídio quando eu não deveria sequer saber o significado de tal palavra. Não morri. Mas, percebi que quando uma pessoa pensa em se suicidar, e realmente tenta fazê-lo, mesmo que não consiga, essa pessoa já morreu um pouco, porque não há nível mais baixo a que uma pessoa possa chegar do que quando está convencida que já não quer viver, que não é merecedora da vida. Eu cheguei a essa fase numa idade muito tenra. Isso marca. O ano de 2016 foi o ano em que as coisas começaram a melhorar para mim e o pesadelo foi acabando. Fui estudar para o balleteatro no Porto, tirar o curso profissional de teatro. A escola tinha quase nada a ver com aquilo que eu tinha passado até ali chegar. De cada vez que eu entrava no comboio tinha plena consciência de que a minha vida estava a mudar e que finalmente havia luz ao fundo do túnel. Conheci imensa gente que me fez muito feliz. Conheci a minha melhor amiga, a quem posso confiar a minha vida. Conheci professores que me moldaram, conheci pessoas com todas as vivências. E pouco a pouco fui-me conhecendo a mim. Sentia que estava cada vez mais perto de descobrir o que estava de errado comigo. E foi aí que eu percebi o porquê de eu nunca me ter encaixado na minha caixa, de nunca ter gostado do meu corpo nem do papel que eu ocupava enquanto membro da sociedade. Foi precisamente numa aula que um professor (que mudou a minha vida) me apresentou a minha inspiração de vida. Marsha P. Johnson. Uma mulher trans, negra que em 1969 lutou pelos direitos da nossa comunidade. Aquilo fascinou-me tanto que passei as semanas seguintes a pesquisar, a ler, a ver documentários sobre a Marsha, sobre Stonewall, sobre a comunidade LGBTQ+ e especialmente sobre a letra T. Sobre o que era ser trans. Aí senti-me uma criança a descobrir o sentido da vida. Afinal eu pertencia a algum lugar. Eu era alguém. Eu era uma rapariga trans. E aí tudo começou a fazer sentido para mim. É muito difícil encontrar o nosso lugar no mundo. Especialmente quando se lida com questões de género. Em 2019 fui a uma consulta no centro GIS para iniciar o meu processo. Cheguei à conclusão que ser trans não é algo que se possa escolher não ser, não é algo que possa ser varrido para debaixo do tapete. É um processo que existe e que faz todo o sentido do mundo para mim passar por ele para encontrar a felicidade e a paz comigo mesma. Foi assim que renasci. Como Ana Margarida ou Mia. É uma batalha muito grande. Odeio ter de lidar todos os dias com as barreiras físicas que o meu corpo me impõe para me fazer parecer algo que eu não sou. Mas sou uma mulher muito forte e embora vá abaixo muitas vezes por tudo isto parecer uma luta sem fim, estou em paz com quem sou cá dentro, e com muita vontade de fazer o exterior transparecer o meu interior. Faço-o por mim e pela minha felicidade. No inicio de 2022 mudei o meu nome no cartão de cidadão e foi um dos melhores momentos. Em Maio comecei o tratamento hormonal e desde então tem sido gratificante assistir às mudanças do meu corpo e sinto cada vez mais uma felicidade pura em ser eu mesma. Dois anos depois de iniciar este processo e vivendo 100% como a mulher que sou sinto me mais feliz do que o que podia imaginar. E agora chegou a altura de dar o último passo. Mas para isso preciso de ajuda. Portugal que deixar as pessoas trans a serem a vida toda apenas mais um número numa lista de espera e adiar a nossa vida para sempre sem perceber o impacto fortíssimo que isso tem na nossa saúde mental. É uma coisa que quero muito, e por isso criei este GoFundMe, porque nao consigo mais aguentar sem dar este passo que tanto significa para mim. É o meu sonho. Cada donativo será usado para que finalmente consiga terminar a minha transição. Estamos na reta final e por isso toda a ajuda conta! ♡ xxMia


ENG:
I'm Mia, and I need your help to move forward with my transition. As you know, it is a very time-consuming and expensive process, so I decided to create this GoFundMe to help cover the expenses of my transition. Any help is welcome, whether it's through donations or sharing.

Below is a little text about my journey. I know it's long, but it would mean a lot to me if you could read my words.


My name is Ana Margarida. Until recently, I didn't even know that was my name. I referred to myself by another name, another being, another person who wasn't me.

I have always known that I didn't fit into what the world had planned for me. The world plans things for us even before seeing us, hearing us, or feeling us. A few ultrasounds are enough to decide what I should be, what I should think, what I should wear, the place I should occupy in society, what I should do, and especially what I shouldn't do. The past five years of my life have been a real roller coaster, years of discovery, exploration, and growth.

I grew up happy. I didn’t lack anything, neither materially nor emotionally. I was a normal child, very connected to performing arts in general. Music was always present. From my mother's questionable taste in CDs to the grand concerts I gave in my head, holding the handle of any broom to pass the time.

I realized I was different in terms of sexuality and gender from... always. As a child, I never questioned it because these are not subjects to be discussed. "It is what it is." When I looked at a heterosexual couple in a mall, in a movie, or on the street, I imagined myself in the girl's position, attracted to the boy. And this seemed normal to me. Until I started school.

I imagine that starting elementary school must be scary for any child, but I couldn't even guess the trauma that would arise from it. It was in elementary school that I realized what I felt wasn't that normal after all. I shouldn't always be playing with dolls with the girls but instead playing soccer with the boys on the field and fighting over the most trivial things. I shouldn't spend breaks inventing choreographies to Lady Gaga songs playing on the radio. And then I realized that there was a place for me. I would then be gay - a boy who likes other boys. I just didn't know how much it would make me suffer. At the time, I didn't realize how obvious it was or how everyone at school knew, cared for, and used it against me every day, every hour. At first, it was just giggling, comments, a "faggot" here, a "sissy" there. Until it escalated to physical violence. Getting slapped for no reason, getting kicked because I was a faggot. I vividly remember the day when I just wanted to go to the bathroom during a class like any other child and one of the older students in the school was ready to pin me against the wall while kneeing my genitals. Since then, I have had this image of being repeatedly assaulted with no one around to stop it. That marked the day when going to the bathroom during school hours became unthinkable. I would go in the morning, when I woke up, and then at the end of the day when I got home. I would do it to protect myself. That was my reality for four years, between the ages of six and ten. I don't think I need to say how awful it is to think that the worst part of your life will be at age 10.

It wasn't. I changed schools, and everything got worse. I thought I would finally have a fresh start, from scratch, this time slightly older and more aware. It was surely going to be better.

It wasn't.

It started on the very first day of school. During the lunch break, while I was still getting to know the school, I found myself alone for a few seconds. That was enough for about six older boys to surround me out of nowhere and start calling me names and spitting on my face. I was lucky that a girl was nearby. She started shouting at them and gave me space to escape. I wasn't safe anywhere. I spent that day running from side to side so that no one could catch me. At the end of the day, I had to go with my mother to buy a new backpack. The one I had was already torn from running so much with it. My back and shoulders were bruised, and that was one of the first contacts my mother had with the situation that was happening.

I was being bullied. There wasn't a day I left that school without being a victim of aggression, whether verbal, physical, or material. That became my new normal.

I started hating myself. The problem had to be with me. And something about me wasn't right, even though I couldn't exactly define what it was.

I stopped eating... that's why I suddenly lost a lot of weight. I partly stopped eating by choice, so I wouldn't be "the fat one" anymore. And partly because many times in the cafeteria, other kids would spit on my plate, throw garbage at my food, and I saw the staff watching without doing anything. I had no voice. There were days when they threatened me with lighters and X-acto knives. I must have been around 11 or 12 years old, and that leaves a mark. That was the darkest phase of my life, so dark that I don't know how I survived. I tried to give up. I tried to end it all. I was very close to being very far away. I, a child, was attempting suicide when I shouldn't even know the meaning of such a word.

I didn't die. But I realized that when a person thinks of suicide and actually tries to do it, even if they fail, that person has already died a little because there is no lower point a person can reach than when they are convinced they no longer want to live, that they are not worthy of life. I reached that stage at a very young age. That leaves a mark.

The year 2016 was the year things started getting better for me, and the nightmare was ending. I went to study at Balleteatro in Porto, taking a professional theater course. The school was almost nothing like what I had experienced before. Every time I got on the train, I was fully aware that my life was changing and that there was finally light at the end of the tunnel.

I met many people who made me very happy. I met my best friend, whom I can trust with my life. I met teachers who shaped me, I met people with all kinds of experiences. And little by little, I was getting to know myself. I felt that I was getting closer to discovering what was wrong with me. And that's when I realized why I never fit into my own box, why I never liked my body or the role I played as a member of society. It was precisely in a class that a teacher (who changed my life) introduced me to my life inspiration. Marsha P. Johnson. A black trans woman who fought for our community's rights in 1969. It fascinated me so much that I spent the following weeks researching, reading, and watching documentaries about Marsha, about Stonewall, the LGBTQ+ community, and especially about the letter "T." About what it meant to be transgender. That's when I felt like a child discovering the meaning of life. After all, I belonged somewhere. I was someone. I was a transgender woman. And that's when everything started making sense to me.

It is very difficult to find our place in the world, especially when dealing with gender issues. In 2019, I went to a consultation at the GIS center to start my process. I realized that being transgender is not something I can choose not to be; it is not something that can be swept under the rug. It is a process that exists and makes complete sense to me to go through it to find happiness and peace within myself.

That's how I was reborn. As Ana Margarida or Mia.

It is a great battle. I hate having to deal every day with the physical barriers my body imposes on me to make me appear as something I am not. But I am a very strong woman, and although I often feel overwhelmed because all of this seems like an endless struggle, I am at peace with who I am inside and very eager to make my exterior reflect my interior. I do it for myself and for my happiness. At the beginning of 2022, I changed my name on my ID, and it was one of the best moments. In May of the same year, I started hormonal treatment, and since then, it has been gratifying to witness the changes in my body. I feel an increasing sense of pure happiness in being myself.

It is something I really want, and that's why I created this GoFundMe, because it is not easy or cheap in Portugal to undergo transition surgeries. I hope to have your support. ♡

xxMia
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